quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Halloween


O Halloween é uma festa pagã que tem mais de uma origem, adaptada a várias culturas e até mesmo religiões, com diferentes significados. Apelidado no Brasil como Dia das Bruxas, nada tem a ver com a cultura brasileira. Muitos insistem no estabelecimento da data por aqui por pura especulação comercial, ou pelo infeliz costume de simplesmente imitar que vem de fora. Mas o culto a seres sobrenaturais como bruxas, demônios, fantasmas e vampiros, dentre outros, preocupa muitos pais e cristãos de várias denominações.
Nos Estados Unidos, onde a festa ganhou maior relevância, são promovidos bailes, festas à fantasia, enfeitam-se casas, escolas e empresas e as crianças saem pelas ruas pedindo doces de porta em porta no costume do “gostosuras ou travessuras” (trick or treat): caso o dono da casa não dê nada, pode ter problemas como vidraças quebradas, sujeira, pichação ou algo pior. Questiona-se muito se os doces e guloseimas são consagrados a espíritos malignos e depois ofertados às crianças.
O Halloween é comemorado nos países de língua inglesa – principalmente Estados Unidos, Irlanda, Reino Unido e Canadá –, nada tendo a ver com os de outras culturas. Mas alguns países adaptaram o costume e criaram datas como o Dia de Finados (Brasil, dois dias após) e o Dia de los Muertos (Dia dos Mortos, no México). No Japão, a festa foi encorajada pela indústria de doces e guloseimas e a cada ano ganha mais adeptos. No Brasil já são comuns em lojas e supermercados artigos feitos para o Dia das Bruxas. Por aqui, a festa é incentivada por cursos de língua inglesa e pelo comércio, que já quer mais uma entre tantas datas criadas somente para gerar mais vendas.
As origens
Como começou o Halloween é algo que tem várias versões. Remonta às tradições dos povos das Ilhas Britânicas e da Gália, algo em torno de 600 a.C. Originalmente, a data nada tinha a ver com bruxas ou fantasmas. Os celtas, povos que deram origem a várias nações europeias, com tradições mais marcantes no Reino Unido e, sobretudo, Irlanda, realizavam todo ano a festa do Samhain, entre 30 de outubro e 2 de novembro. O festejo marcava o fim do verão e início do outono no hemisfério norte. Samhaim, literalmente, significa “fim do verão”, e a festa era feita para lembrar que o período das plantações e colheitas chegava ao fim, e os tempos difíceis estavam começado, com o rigoroso frio. Eram os dias em que os estoques de alimentos deviam ser checados, os agasalhos eram costurados ou retirados dos baús, a lenha era armazenada e as casas devidamente protegidas para deixar o frio do lado de fora.
Com o tempo, a mesma data começou a ser usada pelos druidas para cultuar os antepassados, embora algumas correntes somente os homenageassem. Na “festa dos mortos”, os celtas pregavam que o pós-morte era um lugar sem fome, sem dor, em completa harmonia. Os sacerdotes druidas alegavam que os antepassados rompiam a barreira entre as dimensões dos mortos e dos vivos e visitavam seus antigos familiares. Como alguns tivessem medo dos “espíritos”, preparavam artefatos que os espantassem, à porta das casas. Mais tarde, esse costume seria adaptado para as famosas abóboras iluminadas com caretas esculpidas, as Jack O’ Lantern (de “Jack of the lantern”, o “Jack da lanterna”), com o mesmo objetivo de espantar maus espíritos em geral.
Com a invasão das Ilhas Britânicas pelos romanos em 46 a.C., as culturas foram misturadas. Desde o século 4 a igreja católica tinha uma data para celebrar todos os mártires da igreja. O papa Bonifácio IV, dedicou-a a “todos os santos”, no dia 13 de maio. O papa Gregório III, no século 7, mudou a data para 1º de novembro para se apropriar da antiga festa pagã e substituir seu significado, adaptando-o para a igreja. No ano de 840, passou a ser feita uma vigília de preparação para a festa em sua véspera, 31 de outubro. Em inglês, a celebração era conhecida como All Hallow’s Evening (“vigília” ou “véspera” de Todos os Santos), passando depois para All Hallow’s Eve, All Hallow Een até a forma atual, Halloween.
As bruxas
A ligação da data com as feiticeiras começou na Idade Média, quando líderes políticos e religiosos perseguiam qualquer pessoa considerada curandeira ou pagã na que ficou conhecida como “Santa” Inquisição (que de santa nunca teve nada). Os que eram considerados culpados eram torturados até a morte, ou queimados vivos publicamente. Como na véspera de Todos os Santos foram instituídas pela Igreja várias restrições, os descendentes dos Celtas não mais viam a data com bons olhos. Mais tarde, tanto católicos quanto algumas correntes protestantes perseguiam quem comemorasse o Halloween, na famosa “Caça às Bruxas”.
A ligação da data com as bruxas ficou ainda mais forte com a ida dos imigrantes irlandeses para os Estados Unidos no século 19. Povo de origem celta, comemoravam a data secretamente enquanto eram perseguidos.
Com o fim da perseguição, as culturas misturaram-se e o Halloween passou a ser comemorado livremente, tanto como somente um fenômeno cultural para alguns como para celebrar os mortos, para outros.
As fantasias
Vários elementos foram sendo somados pelas culturas ao longo dos anos. A Europa, por volta do século 14 e 15, foi flagelada pela “peste negra”, a peste bubônica, transmitida principalmente pelos ratos, que dizimou praticamente a metade da população do continente. A morte era algo muito presente nas vidas de todas as famílias, temida o tempo todo. Multiplicaram-se missas e cultos, e nelas eram realizadas representações artísticas que lembravam a todos de sua mortalidade, com fantasias macabras. Com o tempo, já finda a peste, as fantasias ganharam as ruas tanto para o antigo objetivo de lembrar a mortalidade quanto por pura diversão.
Voltando um pouco, na era medieval, usava-se em 31 de outubro o costume de as pessoas da porção mais pobre do povo passarem de porta em porta pedindo comida, dinheiro e orações pelos seus familiares mortos, que eram ofertados pelo medo que os moradores tinham dos espíritos em geral.
Os britânicos, mais tarde, já tinham o costume de bater às portas disfarçados, pedindo alimentos e bebidas – se não ganhassem, penalizavam os moradores com danos à propriedade.
As fantasias também tinham, em algumas culturas, a função de “espantar os maus espíritos”. Na Escócia, era comum os jovens se fantasiarem como a morte em uma roupa que imitavam como ela era personificada na época: um manto branco com capuz, com a face pintada de preto.
Os irlandeses contavam uma antiga lenda, a de Jack of the Lantern, ou Jack O’ Lantern. Jack, um bêbado que fizera um pacto com o diabo, vagava pela Terra depois de morto com uma lanterna feita de um nabo com uma brasa em seu interior, procurando um lugar para o repouso eterno. Jack, no Halloween primitivo, era representado por uma cabeça de barro oca com uma vela ou lamparina no interior. Como no hemisfério norte outubro é época da colheita de abóboras, legume barato encontrado em enorme quantidade, o costume de esculpir uma abóbora com uma vela dentro juntou a lenda de Jack e o velho costume de caretas à porta de casa para espantar os maus espíritos – além de, hoje, ser um grande desperdício de um rico alimento. Justamente por ser a época da colheita das abóboras, tanto os pratos do Halloween quanto os da festa de Ação de Graças, nos Estados Unidos, as têm como principal ingrediente na forma de tortas, purês e doces. Algumas receitas, hoje comuns a vários países, são típicas do Halloween antigo: as maçãs carameladas ou maçã do amor (por também ser época de colheita) e os barmbracks irlandeses, pães com frutas semelhantes ao nosso panetone.
O Halloween de hoje juntou aspectos de várias culturas: o culto aos mortos e a crença de que espíritos malignos vinham à terra na madrugada de 31 de outubro, as fantasias europeias, os doces contra as travessuras e as abóboras iluminadas. O cinema muito explorou a ligação da data com o sobrenatural em filmes de suspense e terror, contribuindo ainda mais com o ar macabro.
Hoje, crianças e adultos saem fantasiados, principalmente de assombrações, bruxas, zumbis e demônios, algumas sem a menor noção do que fazem, puramente por costume. Outros preferem participar das festas com fantasias de outros personagens não ligados exatamente ao terror, como super-heróis, vilões e heróis do cinema e da tevê, caubóis, vultos históricos, piratas, policiais, bombeiros, soldados, cavaleiros, príncipes e princesas, personalidades, entre outros. As casas e empresas são enfeitadas com temas macabros: cemitérios, caveiras, aranhas, morcegos, caldeirões de bruxas.
As crianças continuam com o “gostosuras e travessuras” nos subúrbios, os adultos fazem festas à fantasia mais, digamos, picantes, regadas a muita bebida alcoólica. Uma versão ianque para o carnaval brasileiro. Algumas religiões proíbem a seus fiéis a celebração do Halloween.
No Brasil
Festas de Halloween no Brasil são um fenômeno recente. Há cerca de 20 anos, começaram a aparecer os bailes à fantasia na data, realizados por cursos de língua inglesa, escolas em geral e pela influência da mídia. O Governo, tentando nacionalizar a festa, tentou melhorar alguma coisa, lançando, no mesmo 31 de outubro, o Dia do Saci. De nada adianta substituir os seres sobrenaturais de outras culturas pelos daqui. A vontade do comércio, principalmente de algumas indústrias de guloseimas, é que a festa pegue por aqui como aconteceu no Japão, país com forte apelo consumista. Mas os aspectos culturais e religiosos devem ser questionados, pois as crianças vêem apenas uma chance de brincar com fantasias – o que nada tem de errado em outras datas ou festas que nãos sejam o Halloween ou o carnaval, dependendo da fantasia, claro. Já os pais, estes devem apelar ao bom senso.

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